Encontro Nacional de Formação da Comissão Pastoral da Terra (CPT), neste ano, gira em torno de artigos científicos e estudos de caso produzidos pelos/as agentes de pastoral durante curso de extensão. 16 trabalhos são apresentados. No bojo dessas apresentações, o tema do V Congresso Nacional da CPT também já começa a ser debatido. O evento, que ocorrerá em Marabá entre os dias 12 e 16 de julho de 2020, teve sua identidade visual (imagem ao lado) lançada nesta quinta-feira (24).
Fonte / Imagens: Assessoria de Comunicação da CPT Nacional
Arte cartaz: Filipe Almeida @estudiodumundo
“Romper Cercas… Tecer o Bem Viver” é o tema dessa edição do Encontro Nacional de Formação, que ocorre entre os dias 23 e 26 de outubro, em Hidrolândia (GO). Com agentes de pastoral de todo o Brasil, esse momento formativo é realizado anualmente. A mesa de abertura do encontro, na quarta-feira (23), abordou os “Desafios da reforma agrária e ressignificação da luta”, e contou com a assessoria de Carlos Walter Porto-Gonçalves, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), e Valéria Santos, da Articulação das CPT’s do Cerrado.
Com uma fala baseada na temática: “Corpo e mentes em territórios em disputa”, Valéria apresentou várias cartas políticas recentes para mostrar que a CPT, internamente e nos mais diversos espaços que integra, tem discutido essa ressignificação da luta e os desafios da reforma agrária sim. Conforme ela, a Carta do 1º Encontro Nacional das Juventudes do Cerrado, realizado em dezembro de 2018, apresenta muitos elementos importantes para essa ressignificação, pois isso passa também por nos aceitarmos.
“Muitas vezes deixamos de falar ou tocar em certas questões, mas a juventude vem trazer diversas pautas, como que ‘não adianta falarmos de territórios livres com corpos presos’. Porque se essa juventude não se enxerga nesse processo da reforma agrária, se no território não cabe a juventude e as mulheres, onde os cabem? Precisamos pensar essa ressignificação com esses elementos que a juventude e as mulheres trazem, que não são novos e não foram inventados agora”, analisa a integrante da pastoral.
Quando, em um documento, as mulheres afirmam: “Nós denunciamos todas as violências que sofremos em nossos corpos e territórios”. Isso é muito significativo e mostra um olhar para dentro, conforme Santos, que complementa: “Nós temos uma diversidade de povos, e nossa população, em sua maioria, é negra e indígena, e para isso é necessário olharmos para essa diversidade se quisermos pensar em ressignificação”.
Um exemplo de luta por território apresentado por Valéria vem da Comunidade Serra do Centro, situada no município de Campos Lindos, no Tocantins, que há mais de 25 anos resiste ao agronegócio, que tem atacado as forma de sobrevivência da comunidade, como a saúde, a força de trabalho, entretanto, até hoje, não conseguiu tirar o sagrado da comunidade, que está no Território. Nesse sentido, dona Raimunda Pereira, da Gleba Tauá (TO) sempre afirma: “Eles podem tentar de tudo, mas nunca vão conseguir tirar o meu sagrado. Meu corpo é fechado. E isso não vão me tirar”.
“O território é a água, é a vivência, a partilha, o sagrado, o Cerrado, que o agronegócio tenta tirar, mas não consegue em sua essência” – dona Raimunda
Para o professor da Universidade Federal Fluminense, a CPT, quando fala em ressignificar a luta e a reforma agrária, significa que ela está disposta a atualizar essa pauta, “porque a essência do debate da reforma agrária é esse, a concentração fundiária, e é por isso que esse debate ainda é central para a Pastoral”. E para ele, esse debate se torna ainda mais necessário, pois reflete sobre uma reforma agrária que contemple, também, os povos e as comunidades tradicionais. “A CPT amplia esse debate, e traz a terra enquanto extensão da vida. A defesa da vida humana, das populações, das florestas, da água. Onde é que se tem água e vida em abundância hoje? É nas comunidades. Então essa luta não é só das comunidades, mas da humanidade como um todo”.
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Em 2009, a publicação anual da CPT, Conflitos no Campo Brasil, mostra, nos dados ali compilados, o quanto a violência no campo estava voltada para as comunidades tradicionais. “E a CPT olha para essa situação como algo sensível e importante. Todavia, essa luta por Território foi reconhecida tardiamente, pois ela já estava enraizada na América Latina, que, desde a década de 1990, já reivindicava Liberdade e Território”. E ao falar da diversidade de povos e comunidades tradicionais no Brasil, o professor destaca a importância de se respeitar a autodeterminação das identidades dessas populações.
“Na Chapada do Apodi, no Ceará, por exemplo, na época da colheita, cerca de 5 mil trabalhadores rurais assalariados temporários estão ali. O que vamos fazer? Abandonar? Isso é uma problemática quando discutimos a reforma agrária. De onde é essa gente? Será que em nossa ressignificação a gente não tem nada a dizer para essa gente? Como pensar esses novos problemas com os velhos dilemas da reforma agrária? Temos de repensar isso nesse processo de ressignificação”, questiona Carlos Walter.
Por fim, ele analisou da importância da fala de Valéria Santos sobre pensar uma reforma agrária que leve em consideração mulheres, juventudes, LGBTQ+, questões de gênero e etc. “Mas há algo em comum: como que essas vidas se reproduzem sem o território? A gente tem de ser capaz de ver como essas questões todas se relacionam, como os corpos e as mentes são sentidas nesses lugares. Das condições materiais para que esses grupos continuem existindo. Por isso que o conceito de território é muito complexo. E não podemos jogar fora as identidades quando discutimos territórios”.
Pastoral em constante formação
Neste Encontro Nacional de Formação, estão sendo apresentados artigos científicos e estudos de caso produzidos por agentes da CPT que participam do Curso Nacional de Formação da CPT, dividido em quatro etapas, e realizados em cinco Pólos nas cidades de Belém (PA), Belo Horizonte (MG), Juazeiro (BA), Porto Velho (RO) e São Paulo (SP). Com cerca de 110 participantes, esse curso de extensão é resultado de uma parceria entre a Pastoral da Terra e universidades nos estados.
Romper as cercas do capital na Terra e Território ameaçados; Tecendo Teias e Construindo o Bem Viver na Casa Comum; Produção e Reprodução da Vida; Ressignificação na luta pela Terra/Território e Água, e Pastoralidade e Missão. Para cada um desses temas, 16 trabalhos serão apresentados.
No trabalho apresentado pela representante da CPT Araguaia-Tocantins, foi destacado que desde o ano de 2013, a equipe desenvolve um processo de formação e reflexão sobre a violência contra as mulheres nas comunidades camponesas. A necessidade para o início desse trabalho vem, segundo ela, a partir da identificação de algumas problemáticas, tais como: Situações de violências; Machismo e patriarcalismo; Pouco conhecimento sobre seus direitos; e Fragilidade organizativa das mulheres em seus territórios.
O Estudo de Caso desenvolvido pela agente de pastoral, diante disso, teve como compreender as condições de vida e os desafios encontrados pelas mulheres nas comunidades acompanhadas pela Pastoral da Terra, além de analisar quais são as dificuldades que as mulheres enfrentam para acessar as políticas públicas de amparo contra as violências sofridas no campo.
V Congresso Nacional da CPT
Em 2015, Porto Velho, em Rondônia, recebeu o 4º Congresso Nacional da CPT e fez ecoar o grito “Faz escuro, mas eu canto”. Quase cinco anos depois, nesta quinta, foi lançada, durante o Encontro Nacional de Formação, a identidade visual do próximo Congresso da Pastoral, que será realizado em julho de 2020 no município de Marabá, no Pará. Esse quinto evento conta com o tema “Romper as cercas do capital na Terra e Territórios ameaçados e tecer as teias do Bem Viver na Casa Comum” e lema “Somos Terra, Somos Água, Somos Vida”.
“O Congresso é sempre maior que a CPT, porque ele busca ser a expressão viva do encontro dos povos do campo, das águas e das florestas, a quem a Pastoral da Terra é mera servidora e animadora. De forma privilegiada nestes Congressos, a CPT abre olhos, ouvidos e coração para a escuta, para traçar os caminhos que os/as camponeses/as apontam, para reafirmar nossa presença e missão”, explicaram, no Jornal Pastoral da Terra, o quão importante é um Congresso para a entidade, Paulo César Moreira e Ruben Siqueira, ambos coordenadores nacionais da CPT.
Desde a virada do século, já foram realizados quatro Congressos, que são marcos referenciais de nossa caminhada: O I em Bom Jesus da Lapa (BA) em 2001; o II na Cidade de Goiás (GO) em 2005; o III em Montes Claros (MG) em 2010; e o IV em Porto Velho (RO) em 2015.
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